Entrevista

Internet a serviço do consenso

Internet a serviço do consenso

Debater a utilização da rede mundial é o objetivo do seminário A Internet e a Nossa Vida: Razão, Afeto e Convivência, que ocorre na sexta-feira, 5, na sala 102-K. Entre os convidados estão os professores Adair Rocha, Adriana Braga, Arthur Ituassu, Claudia Pereira, Danilo Marcondes, Lilian Saback e Muniz Sodré, os jornalistas Luis Erlanger e Adriana Barsotti, e o deputado estadual Alessandro Molon (PT). O coordenador de pós-graduação do Departamento de Comunicação e do Projeto Comunicar, professor Miguel Pereira, organizador do encontro, conta que a proposta é mostrar os pontos positivos e negativos existentes no universo virtual e contribuir para a vivência responsável nas redes sociais. “Usar a internet na defesa do interesse público, é ótimo”, enfatiza.

Como as pessoas estão usando a internet nos dias de hoje?

Miguel Pereira: De uma maneira natural. Vão aprendendo e vão fazendo, vão usando. Mas as pessoas não refletem muito sobre o uso que fazem da internet. Essa é uma dificuldade, porque você acaba, de alguma maneira, sendo usado pela internet e não usando a internet. Você não se torna sujeito desse processo. Como a facilidade é muito grande e a tecnologia é muito acessível, as pessoas usam quase que irresponsavelmente esse meio, sem pensar duas vezes no que estão fazendo. Pode errar, acertar, criar uma situação complicada ou favorável. Não importa muito. Depende de como a pessoa é capaz de fazer isso. Na internet é muito fácil, por exemplo, você difamar o outro. Se você tem um espírito negativo, você difama o outro. Você faz do outro objeto do seu preconceito. Na verdade, na internet você está vivendo a sua vida cotidiana. Você não deixa de ser você quando usa a internet. Nós estamos muito mais trocando imagens do que propriamente dialogando entre nós. O diálogo é importante. A internet ainda é fascinante para nós, ela ainda não se naturalizou na nossa vida. Ou se naturalizou de uma maneira superficial. Esse é um problema que nós vivemos hoje na civilização contemporânea.

Quais são os pontos positivos e os pontos negativos da internet?

Miguel: Se você olhar com cuidado, a internet tem muito mais pontos negativos do que positivos. Na imagem, nas mensagens, na concepção de mundo, de vida, você corre muito mais atrás do conflito, do que do amor, da integração, do valor, da amizade. Como ponto positivo, a possibilidade do diálogo entre as pessoas. É claro que é formidável eu ter contato com uma pessoa que está distante de mim e eu, de alguma maneira, nesse diálogo, aprender com ela. Esses diálogos são enriquecedores, são de crescimento mútuo. Essa é a grande qualidade da internet. O outro ponto é o negócio da internet. E este tomou conta da internet de tal maneira que hoje você é invadido completamente pelo negócio. Você não é respeitado, a sua privacidade é completamente arrasada. Há um desregulamento dos negócios da internet que acabaram tomando conta dela. Quem toma conta da internet é o valor econômico. Para mim, esse é o grande problema. Você não tem privacidade, e nem o elemento central da vida que é a liberdade. Eu acho que a internet não é um espaço de negócio, de compra e venda. Pode até ser, eu já comprei coisas pela internet absolutamente fantásticas. Agora o produto em si, por que eu sou obrigado a ter esse produto na minha cara? Não sou. Então o regulamento da internet, o Marco Civil, que ainda está sem regulamentação, ele é uma peça fundamental para que haja uma certa hierarquia nisso. Eu não posso ser submetido a essa coisa avassaladora do negócio. É necessário ter negócios na internet, sim. Mas com ética, respeitando a privacidade, o direito e a liberdade do outro. Aquilo que seria a democratização do conhecimento, e da relação entre as pessoas, se torna uma coisa imposta e nós temos que pensar e refletir sobre isso.

Qual a contribuição do seminário para a sociedade?

Miguel: A internet não pode ser um objeto de dissenso na sociedade. Tem que ser de consenso, de agregação, de entendimento entre as pessoas. E o objetivo do seminário é mostrar isso. Nós usamos as mídias sociais, contemporâneas ainda muito timidamente. Usar a internet na defesa do interesse público, é ótimo. Quando é apenas autoafirmação, às vezes, não é bom, porque não damos espaço para ninguém, só para nós mesmos. Para mim, a internet é diálogo, é relacionamento. Não podemos ter uma mídia social que convoca as pessoas para a destruição da vida, para o massacre. E esse não é o caminho. O caminho da civilização é da concórdia, da relação positiva, do amor, da fraternidade. Não da disputa. E a internet tem que estar a serviço disso.

É necessário pensar em mais leis para normatizar as relações na internet?

Miguel: Algumas coisas essenciais, sim. Os abusos e a invasão de privacidade têm que ser definidos claramente. A liberdade de ser na internet tem que existir e ser preservada. A legislação civil e penal que está aí é o suficiente, não precisa ficar regulando tanto. É preciso garantir a ética, a preservação da privacidade. O negócio deve ser regulado. Regular o negócio na internet é fundamental, não pode ser essa liberdade absoluta do mercado regulando tudo. O mercado é agressivo e não pode controlar tudo. Eu não posso dar o poder da internet a um grupo só. Tem que ser múltipla, não pode ser centralizada. Não posso permitir que uma mesma empresa tenha tudo. Tem que diversificar mais. Isso é regulamento. O nosso Marco Civil, apesar de ainda não estar totalmente regulamentado, é um dos mais avançados. O marco é apenas o orientador, agora tem que regulamentar. Você tem um instrumento na mão absolutamente formidável e que não pode ficar na mão de meia dúzia de pessoas como está.