Entrevistas

Coletânea reúne análise de textos de Clarice Lispector, em comemoração do centenário do nascimento da escritora

Por: Maria Clara Aucar

Coletânea reúne análise de textos de Clarice Lispector, em comemoração do centenário do nascimento da escritora

Organizada pelo Decano do Centro de Teologia e Ciências Humanas (CTCH), professor Júlio Diniz, a coletânea Quanto ao futuro, Clarice, será lançada no dia 29 de novembro, às 19h, na Livraria da Travessa do Shopping Leblon. O livro, coeditado pela Editora PUC-Rio e pela Editora Bazar do Tempo, celebra o centenário do nascimento de Clarice Lispector e reúne textos de críticos, teóricos e pesquisadores da obra da escritora.

Como surgiu a ideia do livro?
Professor Júlio Diniz:
Com 14 anos, li um conto de Clarice e fiquei absolutamente seduzido e encantado pela autora e, desde a adolescência até agora, sou leitor assíduo da obra. Em 2019, eu sonhei com uma série de eventos em comemoração do centenário de nascimento da Clarice, que ocorreu no dia 10 de dezembro de 2020. Em princípio, a ideia era fazer um evento, que seria na PUC. Para isso, eu acelerei uma parceria com o Instituto Moreira Salles (IMS) da Gávea, que entrou conosco nesta ideia, e com o suplemento literário maravilhoso, o Pernambuco, que é do Recife. E aí a ideia ampliou: seria um evento que ocorreria na PUC e no IMS, de segunda a sábado, com convidados brasileiros e estrangeiros. E leitura de textos da Clarice, com toda uma atividade acadêmica e artística em torno do centenário. Junto a isso, haveria o lançamento de um livro, e o IMS faria uma exposição em São Paulo, que depois viria para o Rio de Janeiro, já que eles têm uma parte do acervo da escritora. Aí, o que aconteceu? Veio a pandemia e tivemos que suspender tudo. Quando a pandemia começou a melhorar, as pessoas ficaram muito inquietas, eu principalmente, e resolvemos continuar o projeto. Mas nós não iríamos fazer um evento on-line, já estão todos cansados de lives. Então resolvemos seguir o livro e, o IMS, a exposição. Há mais ou menos um mês, a exposição “Constelação Clarice” foi aberta no IMS Paulista, em São Paulo. Alguns objetos da exposição, como a entrevista ao jornal Pasquim e primeira edição de livros infantis, são meus e eu os emprestei para a exposição. E o nosso livro acabou de sair. Assim, o livro continua pela PUC-Rio, com apoio do IMS e com apoio do Paulo Gurgel Valente, que é filho da Clarice e nos ajudou muito.

Como foi a escolha dos autores?
Professor Júlio Diniz:
Eu tinha um repertório enorme de pessoas, um elenco de grandes ensaístas, teóricos, professores e críticos da Clarice. Quando resolvi retomar o livro, muitas pessoas ainda estavam traumatizadas e, ao mesmo tempo, recolhidas, um pouco melancólicas por causa da pandemia e por outras circunstâncias que estamos vivendo agora no Brasil. Havia um certo desânimo, um imobilismo. Então, eu comecei a convidar as pessoas e, alguns, em primeiro momento, aceitaram a proposta como uma maneira de responder à pandemia. O livro é uma resposta ao nosso tempo. Ele não é um tributo ao passado, não é um livro que fala melancolicamente ou com nostalgia de Clarice e do tempo dela. Não é um livro para exaltar a escritora, porque ela não precisa disto. Não à toa que o título, retirado de A hora da estrela, é Quanto ao futuro. É um livro que quer marcar a Clarice do presente em direção ao futuro. O vetor de luz e felicidade e de liberdade em direção ao futuro. São pesquisadores de idades e lugares diferentes, inclusive ex-alunos do Programa de Pós-Graduação em Literatura, Cultura e Contemporaneidade; ex-alunos do mestrado e doutorado que fizeram textos excepcionais. Nós conseguimos reunir 19 ensaístas.

O livro é composto apenas de ensaios?
Professor Júlio Diniz:
Eu, os pesquisadores e a professora Margarida de Souza Neves descobrimos, no Núcleo de Memória da PUC, algumas fotos inéditas da Clarice. Elas foram tiradas aqui na Universidade, em 1975, em um evento organizado por Affonso Romano de Sant’Anna, que era o diretor do Departamento de Letras. Nestas fotos, a Clarice aparece sempre ao lado de duas grandes amigas: Marina Colasanti e Nélida Piñon. Nós colocamos as imagens no livro. A PUC inteira colaborou com a coletânea. O projeto gráfico foi do Escritório Modelo do Departamento de Design; o Departamento de Letras nos ajudou muito. É uma coisa que tem muito a cara da PUC. Eu fiz entrevistas com a Marina e a Nélida, que deram depoimentos. Estes dois depoimentos são lindíssimos e estão no livro. A Maria Bethânia foi uma das responsáveis por levar Clarice para o grande público; nos shows, Bethânia lia os textos de Clarice, virou uma tradição. E eu perguntei se ela poderia dar um depoimento para o nosso livro e, na mesma hora, ela aceitou. E deu um depoimento original e inédito, que encerra o livro.

Quais são os textos fundamentais da obra de Clarice Lispector explorados no livro?
Professor Júlio Diniz:
São os contos, os textos de literatura infantil e, principalmente, A paixão segundo G.H., Água Viva, Uma aprendizagem ou O livro dos prazeres e A hora da estrela. Na verdade, a coletânea fala sobre quase todas as obras de Clarice, inclusive das cartas e das crônicas. Cada autor escolheu o seu caminho, eu os deixei totalmente livres. Quanto ao futuro, Clarice é um marco nos estudos de Literatura Comparada, de Literatura Brasileira; é um marco nos estudos da obra de Clarice. Ele vai contribuir muito para novas pesquisas, análises e livros e é uma produção que tem a cara da PUC-Rio.

Quais foram as maiores dificuldades?
Professor Júlio Diniz:
Foi a pandemia, a situação de instabilidade social e econômica que estamos vivendo no Brasil. A pandemia foi um fator inibidor. Ela freou tudo aquilo que queríamos fazer. De outro lado, todos nós resolvemos que iríamos fazer um livro, porque precisávamos nos libertar dessa loucura. Nos libertar no sentido de que, mesmo em casa, mesmo no home-office, iríamos trabalhar. Nada melhor para reagir à escuridão, à sombra e à morte do que a literatura, do que a arte e do que Clarice.

Qual é o sentimento de lançar um livro presencialmente depois de tanto tempo de pandemia?
Professor Júlio Diniz:
É um dos primeiros lançamentos presenciais com uma dimensão maior. Vai ocorrer na Livraria da Travessa do Shopping do Leblon e há uma expectativa muito grande. As pessoas, cumprindo todas as normas sanitárias e de distanciamento, querem se reencontrar, querem pegar o livro, querem o autógrafo dos autores. É um encontro de felicidade. Estaremos todos Perto do coração selvagem da vida.