Entrevistas

Favela, História e Direitos

Por: Por Henrique Barbi

Favela, História e Direitos

Professor Rafael Soares: memória como ferramenta política dos movimentos de favela

Como forma de promover o diálogo e a reflexão que auxilie na luta dos moradores de favelas e ocupações, o coordenador do Laboratório de Estudos Urbanos e Socioambientais (LEUS), do Departamento de Serviço Social, professor Rafael Soares, em parceria com os professores Mario Brum e Mauro Amoroso, da UERJ, criou o curso Favela, História e Direitos. O programa gratuito, que está com as inscrições abertas até o dia 10 de maio, trata de aspectos como raça, gênero, direito, cidadania e democracia. Destinado aos habitantes das favelas e pesquisadores, o curso será composto por seis aulas com três horas de duração cada, aos sábados de maio e junho. A ideia é refletir sobre a longa história de negação de direitos e de luta, resistência e a criação das formas de mobilização coletiva.

Como surgiu o curso? O que inspirou a criação?
Rafael Soares: Este curso, que dou com os professores Mario Brum e Mauro Amoroso, nasceu porque entendemos que a discussão histórica sobre a memória é uma ferramenta política de muitos movimentos de favela — tanto em termos de construção de identidade, quanto em eventuais conflitos: remoção ou despejo. O trabalho que realizamos em alguns espaços de militância, como a Defensoria Pública e o Conselho Popular, trouxe a ideia de fazer um curso voltado para o debate, o entendimento e a capacitação histórica e jurídica de militantes, lideranças e moradores de favela, sejam eles estudantes universitários ou não.

O curso é promovido por diversos núcleos e parceiros. Quais são eles?
Rafael Soares: O projeto é apoiado pelo Núcleo de Terra e Habitação da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro, Laboratório de Estudos Urbanos e Socioambientais (LEUS) da PUC-Rio, Laboratório de Estudos das Diferenças e Desigualdades Sociais da UERJ e pelos projetos de extensão Vozes da Luta e Procura na Periferia, também da UERJ, com apoio do GT de História Urbana da Associação Nacional de História-RJ (ANPUH). Um dos principais colaboradores é o Núcleo de Terra e Habitação, pois exerce um trabalho importante em várias favelas, loteamentos e ocupações de prédios públicos, além de ser especializado em discussões voltadas a despejos e remoções coletivas. Um serviço semelhante é realizado pelo Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia, que discute a propriedade de maneira muito ampla, não só a da terra, mas também a propriedade comum, pública e privada. Ao todo, cada parceria é essencial para a manutenção deste curso.

Como as suas pesquisas sobre a história das favelas contribuíram para a construção do programa?
Rafael Soares: Em grande parte das pesquisas realizadas sobre memória, museologia social, museus em favelas, eu constato a história como uma ferramenta política por parte de seus moradores. Acredito que há uma perspectiva de compreender as favelas com um certo presentismo, como se fosse um problema atual a ser resolvido. Só que existem favelas com 150 anos, que carregam muita história e identidades fortes construídas, seja pelo samba, seja por outras dimensões. Então, garantir o direito ao passado destes espaços e reconhecer que eles fazem parte da cidade é assegurar o direito de futuro e existência.

Como a Universidade contribui para acabar com os preconceitos sobre a favela e os seus moradores? É um curso que tem a ver com extensão?
Rafael Soares: Primeiramente, desconstruir e desnaturalizar uma série de dimensões me parece importante. A história é um elemento interessante para isso. O olhar da Universidade não pode ser colonizador e o fato de estar aberta aos moradores de favela faz com que essas pesquisas sejam menos esquematizadas e estereotipadas. É importante pensar que não é universidade e favela, mas um conjunto. Além disso, é um papel que cabe a todos nós, professores, pesquisadores e alunos, e também um esforço da Universidade de sempre se questionar e fazer com que a produção de conhecimento seja um elemento de mudança social. Existe um papel de extensão no sentido de incidir na sociedade, e isto faz com que a sociedade também incida na Universidade. Os ares de extensão talvez tragam perspectivas interessantes que aprofundem elementos identitários da PUC-Rio.