Entrevistas

João Moreira Salles: democracia não sobrevive sem academia e imprensa

João Moreira Salles: democracia não sobrevive sem academia e imprensa

Fundador da piauí, João Moreira Salles lança projeto de aproximação com universidades (Foto: Mateus Monte/Acervo Comunicar)

Na quinta-feira, dia 7, a Universidade vai sediar o 1° Seminário Revista Piauí PUC-Rio de Jornalismo. O encontro será das 9h às 13h, na K-102. Na ocasião, o fundador da piauí João Moreira Salles e o editor executivo, Daniel Bergamasco, conversam com o professor Arthur Dapieve sobre o passado, o presente e o futuro da revista. O diretor André Petry e os jornalistas e ex-estagiários da piauí Thallys Braga e Yasmin Santos explicam como começar a escrever para a revista. A produtora-executiva Raquel Zangrandi e os checadores Gilberto Porcidônio (ex-aluno da PUC-Rio), Marcella Ramos e João Felipe Carvalho apresentam o trabalho de checagem. O evento é organizado pelo Laboratório de Jornalismo do Departamento de Comunicação (LabCOM Jor). O PUC Urgente conversou com Moreira Salles sobre a proposta do seminário. O evento vale hora complementar para alunos do 1º ao 3º períodos de Jornalismo e Estudos de Mídia.

A revista piauí organiza festivais de Jornalismo desde 2014, e agora lança este projeto de aproximação com universidades, levando a equipe para conversas e workshops com estudantes em todo o país. É também papel da Universidade estreitar laços entre a academia, o mercado e a sociedade. Quais frutos podemos esperar desta iniciativa?
João Moreira Salles:
A academia e a imprensa são parte da infraestrutura cívica, sem a qual uma democracia não sobrevive. Uma produz conhecimento e pensamento crítico, a outra esclarece os fatos e revela o que o poder (político, econômico) preferiria manter escondido. Faz sentido que essas duas instituições se conheçam melhor, firmem parcerias, se alimentem e se fortaleçam mutuamente. Um dos papeis da academia é fornecer ao aluno o repertório necessário para que possa compreender a sociedade em que vive. Esse é o leitor que queremos. E é também o profissional que um dia poderá trabalhar na nossa redação. Indo à PUC, estamos nos apresentando ao nosso público natural.

A mesa de abertura, com sua participação, será sobre o passado, o presente e o futuro da piauí. Em tempos de plataformas digitais, como enxerga o futuro do mercado de comunicação no Brasil?
João Moreira Salles:
Cada vez mais digital, sem dúvida. A surpresa, contudo, é que essa tendência não representa o fim inexorável dos meios físicos. Nos Estados Unidos, por exemplo, títulos que haviam migrado para puro digital anunciaram que voltarão a existir no formato papel, como é o caso de Sports Illustrated e Vice. Revistas como The Atlantic tiveram um aumento significativo de tiragem e, ainda mais importante, tornaram-se muito relevantes no debate público norte-americano. Não é todo leitor que valorizará o papel, mas existe um número não desprezível de pessoas que querem fruir dos benefícios de uma revista ou de um jornal físicos. Essa fruição vai do prazer puramente táctil e estético de ter um objeto bem feito nas mãos à possibilidade de uma leitura mais atenta, livre das distrações dos links e dos alertas. Ler assim é ler melhor. Para tomar um caso particular, que serve de exemplo geral, a piauí não é apenas o que ela publica. É o ambiente em que o artigo aparece, o que vem antes e depois dele, o diálogo que se estabelece entre a parte da frente e a parte de trás de cada edição, entre a primeira página e a última; não se trata do monólogo de uma reportagem isolada, mas da polifonia do conjunto. Essa característica plural será sempre qualitativamente mais rica nesse formato de centenas de anos que é uma revista.

A revista tem por característica um cuidadoso processo de verificação de cada informação publicada. Qual a importância da checagem no atual cenário do jornalismo profissional?
João Moreira Salles:
Jornalismo é resultado de apuração, escrita, edição e checagem. Não considero que nenhuma dessas etapas seja mais ou menos importante do que as outras. Infelizmente, a crise do modelo econômico do jornalismo desde o advento da internet forçou boa parte dos veículos a sacrificar um ou mais desses pilares. Geralmente, o primeiro que se vai é o da checagem. É um erro. A credibilidade da imprensa depende basicamente de não darmos como certo o que está errado. A última trincheira contra a inexatidão é a checagem. Sem ela, é quase inevitável que os erros proliferem. Nunca escrevi um artigo cujo rascunho não contivesse uma penca de equívocos, alguns sem importância, outros não. O que me salvou – e salvou a revista e protegeu o leitor – é o nosso departamento de checagem.

Você tem se envolvido com a questão socioambiental no Brasil, por exemplo, com sua série de reportagens sobre a Amazônia, transformada em livro (Arrabalde). Como o meio acadêmico pode também contribuir para a amplificação dessas pautas?
João Moreira Salles:
O que se sabe sobre os biomas brasileiros, sobre a riqueza deles, sobre as ameaças que enfrentam, sobre o que se pode esperar do futuro do clima e da vida no Brasil, caso continuem a ser violentados, é resultado do trabalho de pesquisadores espalhados pelas universidades e centros de pesquisa do Brasil e do mundo. Nesse sentido, voltamos à primeira pergunta. É preciso estreitar os laços entre a imprensa e a academia. Vocês descobrem, nós damos a notícia dessas descobertas.