Entrevistas

Projeto ‘Como reparar?’ é escolhido por programa de cooperação internacional

Por: Por Paula Halanna*

Projeto ‘Como reparar?’ é escolhido por programa de cooperação internacional

As pesquisadoras Aza Njeri (à esq.) e Ana Kiffer: múltiplas possibilidades de reparação histórica (Foto: Pablo Campos / Comunicar)

A partir de abordagem interdisciplinar, pesquisa sobre reparação histórica, restituição de patrimônios e memória da escravidão produzirá novos arquivos do passado colonial

Nos dias 27 e 28 de novembro, o Laboratório de Estudos e Pesquisas Interdisciplinares sobre o Continente Africano e as Afro-diásporas (Lepecad) realiza sua Terceira Jornada, quando serão apresentadas as pesquisas desenvolvidas pelos integrantes do laboratório ao longo de 2025. A novidade, este ano, é o lançamento oficial do projeto “Como Reparar? Reconstruir, Restituir, Recontar, Escrever e Representar entre o passado colonial e o tempo presente”.

Com uma proposta de impacto acadêmico e social, o “Como Reparar?” é capitaneado pelas professoras Aza Njeri, do Departamento de Letras e Artes da Cena da PUC-Rio, e Ana Kiffer, do Departamento de Letras e do Programa de Pós-Graduação em Literatura, Cultura e Contemporaneidade. O projeto foi um dos 36 escolhidos pelo programa Capes/Cofecub, que é uma das mais prestigiadas iniciativas de cooperação acadêmica internacional entre Brasil e França.

Inspirado no pensamento do filósofo caribenho Édouard Glissant, o “Como reparar?” assume uma abordagem interdisciplinar que tabalha reparação histórica, restituição de patrimônios, memória da escravidão e a produção de novos arquivos sobre nosso passado colonial. Para além da pesquisa acadêmica, propõe uma prática ativa de transformação social por meio de publicações bilíngues, núcleos de debate e mobilidade internacional de pesquisadores.

O PUC Urgente conversou com Aza Njeri e Ana Kiffer para entender o objetivo do projeto e o protagonismo da PUC-Rio nessa área de estudo e conhecimento. Mariana Patrício Fernandes, Flavia Trocoli, Luciana Sacramento Moreno Gonçalves e as francesas Tiphaine Samoyault, Anne Lafont e Zahia Rahmani também integram a equipe, exclusivamente feminina.

“Se estamos falando de reparação, faz parte da nossa conduta reparatória um projeto que tenha o gênero como um lugar de destaque. Era absolutamente necessário que essa equipe fosse de mulheres”, diz Ana Kiffer.

Como os temas sobre reparação histórica, restituição de patrimônios, memória da escravidão e a produção de novos arquivos serão abordados no projeto?
Aza Njeri:
Vamos abordar o tema principalmente a partir de arquivos, que podem ser literários, artísticos, fotográficos. Nossa ideia é pensar nas múltiplas possibilidades de reparação a partir desses arquivos. É um trabalho interdisciplinar, que não se esgota. E tem uma parte do projeto que é pensar noções que ainda estão sendo discutidas no mundo. É um espaço prático, de formação de quadros, formação de pessoas e formação profissional.

Qual a importância de um projeto que trata de temas voltados para afro-diásporas e ameríndias ter um reconhecimento internacional, mais especificamente da França, que é um dos países colonizadores?
Aza Njeri:
É uma abertura tanto da parte da Cofecub, que é uma agência francesa, quanto da Capes. Estamos entre os 36 selecionados em todo o país, com uma nota de excelência. É um reconhecimento da qualidade do que estamos propondo.Vejo isso com muito bons olhos, principalmente para as próximas gerações.
Ana Kiffer: O acordo Capes/Cofecub foi o primeiro acordo de cooperação internacional universitário travado entre os dois países e criou a base de todos os outros acordos de cooperação, tanto na França quanto no Brasil. É o modelo. E é de um departamento da área de humanas, um projeto interdisciplinar, intergeracional, com uma equipe toda de mulheres. Tem uma força muito grande.

O projeto foi desenvolvido por oito mulheres. Em algum momento, esse fato tornou mais complexa sua aceitação ou validação? Como isso impacta a forma de olhar e conduzir a pesquisa?
Ana Kiffer:
Não tivemos problemas com isso. A escolha da equipe foi parte da ideia de ter um projeto que envolve prática, não só teoria. Se estamos falando de reparação, faz parte da nossa conduta reparatória um projeto que tenha o gênero como um lugar de destaque. Era absolutamente necessário que essa equipe fosse de mulheres.

Vocês citam a criação de núcleos interdisciplinares para debater a reparação. Qual a relevância dessa interdisciplinaridade e como pode fortalecer a pesquisa?
Ana Kiffer:
Acho que o tema em si requisita que a gente dialogue com outros núcleos.
A gente não fala de reparação e reconstrução sem falar com pessoas de Direito, Relações Internacionais, Ciência Política. O tema ainda germina no Brasil, mas já está pipocando em muitos lugares e áreas.

A proposta coloca a PUC-Rio no centro de uma rede internacional de pesquisas. Como essa iniciativa impacta a imagem da universidade no cenário global?
Aza Njeri:
É um ganha-ganha. Sem a PUC, não teríamos conseguido entrar neste edital. Ao mesmo tempo, há o reconhecimento da Universidade pela qualidade do nosso trabalho. Sabemos que áreas como Letras e Arte da Cena enfrentam fragilidades em termos de procura, especialmente em comparação a outras áreas do conhecimento. Nosso projeto trata do encontro entre povos e culturas. Temos ambições concretas e metas claras: criação de arquivos de tradução, intercâmbio e parcerias com fundações que possam ampliar o debate para outros espaços. Esperamos que por todo o país.

*sob supervisão das editoras