Transtornos ligados a vícios em telas e apostas ganham destaque na clínica contemporânea
Por: Pedro Luiz Meireles*
24 de novembro de 2025 as 06:30
Gisele Aleluia: “psicologia clínica avançou muito no cuidado com os transtornos adictivos” (Foto: Pablo Campos / Comunicar)
Gisele Aleluia, professora do Departamento de Psicologia, faz alerta sobre danos ligados à busca constante por prazer rápido, tema de seminário que acontece no sábado
Professora de Graduação e Pós-graduação da PUC-Rio e palestrante do VI Simpósio de Transtornos Adictivos, que neste ano tem como eixo central o papel das avaliações na clínica contemporânea, a psicóloga Gisele Aleluia Vieira destaca como essas avaliações podem contribuir para o diagnóstico, a prevenção e o tratamento das adições.
Nesta edição do simpósio, serão discutidos de forma aprofundada a dependência de telas e o fenômeno crescente das apostas. Em entrevista ao PUC Urgente, Gisele explica por que esses comportamentos têm se tornado desafios centrais na clínica e na sociedade, descreve como estímulos rápidos e intensos alimentam a perda de controle típica das adições, aponta a gravidade particular das apostas por envolverem dinheiro e ressalta a importância de avaliações cuidadosas, da participação das famílias e de novas abordagens terapêuticas no tratamento. O Simpósio será realizado no sábado, dia 29 de novembro, das 8h às 17h15, no Auditório Padre Anchieta (Edifício Cardeal Leme). A programação completa está no link.
Como podemos explicar de forma simples o que são transtornos adictivos e por que eles têm chamado tanta atenção na clínica contemporânea?
Gisele Aleluia: Os transtornos adictivos são condições marcadas pela perda de controle sobre um comportamento ou substância que produz alívio ou prazer imediato. A pessoa passa a repetir esse comportamento, como uso de drogas, compras compulsivas, sexo ou jogos, mesmo quando ele já está causando prejuízos na vida. Esses transtornos ganharam destaque na clínica contemporânea porque estão diretamente ligados ao nosso cotidiano, especialmente à busca constante por prazer rápido. Vivemos expostos a estímulos intensos e imediatos, com efeitos curtos, o que facilita ainda mais a perda de controle. Muitas vezes acreditamos que conseguimos “administrar”, mas, sem perceber, o comportamento vai se tornando compulsivo e difícil de interromper.
Como uma boa avaliação pode ajudar no diagnóstico e no tratamento das adições?
Gisele Aleluia: Uma boa avaliação faz toda a diferença. Muitas vezes as pessoas só procuram ajuda quando as consequências já apareceram, e é justamente nesse momento que o especialista sabe como conduzir: ele faz as perguntas certas para identificar se aquele comportamento configura ou não uma adicção.
O fenômeno das apostas, especialmente on-line, tem crescido muito entre os jovens. O que as torna tão atraentes do ponto de vista psicológico?
Gisele Aleluia: As apostas, especialmente on-line, são atraentes porque ativam mecanismos psicológicos muito poderosos. Quando a pessoa ganha, mesmo que pouco, o cérebro registra aquilo como um reforço positivo, uma sensação de ser “especial”, competente ou sortudo. Além disso, o dinheiro funciona como um estímulo imediato e muito sedutor. Os aplicativos reforçam essa atração com cores, sons, bônus e promessas de ganhos rápidos. Como nossa lógica é muito guiada pela emoção, muitas vezes preferimos um lucro menor agora do que esperar por um maior no futuro. O jogo explora exatamente esse impulso, criando a ilusão de que o ganho está sempre ao alcance. Esse pensamento ilusório faz com que a pessoa continue jogando, tentando recuperar o que perdeu, é aí que se instala o ciclo em que, quanto mais se tenta recuperar, mais se perde.
Há diferenças importantes entre a dependência de telas e a dependência de apostas, ou elas compartilham mecanismos semelhantes no cérebro?
Gisele Aleluia: No caso das diferentes dependências, a de apostas se mostra muito mais intensa porque envolve dinheiro. A de telas está mais ligada a hábitos. Embora os comportamentos possam parecer semelhantes, os impactos não são. Os danos provocados pelo jogo são mais profundos, é uma dependência mais intensa, que frequentemente envolve dívidas.
Quando a adição se confunde com hábitos do dia a dia, quais são os principais desafios para os profissionais e o que as famílias precisam saber para ter um papel importante na prevenção e no tratamento?
Gisele Aleluia: O maior desafio é que a gente precisa ter habilidade, porque existe uma não aceitação por parte de quem tem a dependência e por parte dos profissionais envolvidos. A primeira coisa é a família perceber como é que ela lida com esses comportamentos. Qualquer mudança que a gente proponha é uma mudança no coletivo, incluindo aquele que tem o comportamento. O tratamento é mais eficiente quando o grupo participa. A orientação é: “prepare-se para participar”.
Que avanços recentes da psicologia clínica têm contribuído para melhorar o tratamento dos transtornos adictivos?
Gisele Aleluia: A gente tem abordagens psicoterápicas. Hoje a psicologia clínica avançou muito no cuidado com os transtornos adictivos. Temos terapias mais específicas, que ajudam a pessoa a desenvolver autorregulação e a lidar melhor com a impulsividade. Outro ponto importante é que agora contamos com equipes especializadas, algo que antes não existia. E, além disso, as medicações voltadas para impulsividade e compulsão têm contribuído bastante para fortalecer o tratamento.
*Sob supervisão das editoras



